sábado, 3 de julho de 2010

"Era do Fast-Food, Fast-Cars, Fast-Love".

Hoje não tenho nenhuma história bonita para contar, portanto alerto os leitores para a possibilidade de não terminarem o texto mais sorridentes que no início.

Aqui há uns tempos ouvia-se falar de romantismo e de amor eterno. Era uma coisa tão linda...

Imaginem: havia reis maus, vilões do far-west, e outros bandidos do gênero, mas eram sempre poucos, e para eles havia sempre à altura um enviado herói representante do amor e da justiça (da lei também, quando a lei era feita por reis e governantes justos).
Os bons ganhavam sempre, ficavam com a princesa ou com a menina mais querida, bonita e simpática da cidade, com um castelo e as riquezas e recompensas pelos seus atos heróicos, ou partiam em direção ao por do sol no seu cavalo branco, enfim... Viviam felizes para sempre.
E os homens dos filmes (a preto e branco) cantavam, eram charmosos e vestiam-se bem, ofereciam o casaco às pequenas na noite fria, falavam eloquentemente em prosa ou poesia, e faziam tantas outras coisas românticas.
As pobres mulheres dessa altura pareciam ser uns anjos...aliás, não era por acaso que a dada altura os anjos eram representados como mulheres aladas. Toda a mulher cujo comportamento fosse marginal, era sem dúvida responsabilidade de algum brutamontes sem coração, barrigudo e estúpido que abusou tanto da moça que ela, pobrezita, acabou por se desviar do "caminho da luz e da pureza".
E as coitadas que apenas queriam um homem sincero que as amasse.
Lembro-me também que a partir de certa altura os bons da fita já não tinham apenas uma mulher, e as mulheres por seu lado começavam a demonstrar alguns comportamentos que só se viam antes nos homens.
As mulheres tornavam-se sedutoras, fumadoras, agressivas, descontroladas e impulsivas. E os homens foram perdendo o romantismo. Já ninguém morria por amor. Podia-se arriscar a vida pela "boazona" da fita, e era certo que o herói a salvava ou era ela que morria colocando-se em frente à bala. No fim o herói acabava com qualquer boazona que levava para a cama, acabando o filme com um beijo (mas já sem o feliz para sempre). Foi a "Era do 007".

O romantismo já era um mito de outros tempos. Iniciava-se a "Idade do Engate". Agora o "vencedor" era quem dava a tanga mais estilosa, o tipo corajoso com ar misterioso que nunca se revelava, mas atrás dos óculos escuros podia esconder qualquer realidade. A intimidade era coisa de velhos, dos casalinhos de avôzinhos queridos que nas suas faces cheias de rugas irradiavam o sereno sorriso da matura felicidade e de toda a vida ao lado do seu amor.





Indústria, evolução, grandes cidades, muita gente, cada vez mais gente, cada vez mais, e mais distantes. As mulheres lutam pelo poder, pelo direito de serem livres como o eram os homens.
Emancipação da mulher para um lado, igualdade de direitos para o outro, e as mulheres aos poucos ganharam o direito de serem "homens", ou melhor... ganharam o direito serem tudo aquilo que era criticado nos homens. As tolinhas que acreditavam no amor dos filmes, eram apenas as camponesas antiquadas, que sonhavam em ir para a cidade, conhecer um "príncipe" e viver feliz para sempre.
Agora as mulheres da cidade já não eram assim. As mulheres da cidade eram modernas e dinâmicas. Agora as mulheres já tinham o direito de dizer palavrões como os homens, dizer ao homem idiota "queres jantar então faz tu!", de trair o marido com o vizinho musculado, o polícia que lhe tinha perdoado uma multa e com quem tinha estabelecido uma relação secreta, ou o melhor amigo do homem com quem foi trocando olhares naquelas noites em que os homens se juntavam lá em casa para jogarem poker.
As mulheres ganharam ganho os mesmos direitos dos homens numa altura em que "bons homens" já eram poucos.
E agora, já não há homens como antigamente, nem mulheres como antigamente. Os príncipes morreram, foram-se embora com as princesas ou então desistiram da carreira quando foram traídos pelo pirata do reino, e agora as mulheres eram seduzidas pelo objetos, pelo carro do homem, pelo físico musculado de quem passa metade do dia no ginásio ou ingere esteróides para inchar (o que revela a mente profunda de quem consome drogas para trabalhar a sua aparência), ou ainda pelo poder e dinheiro do homem, e pelas oportunidades profissionais que dormir com ele podiam trazer.
Os homens destes dias? Broncos, pobres idiotas e falhados. Os românticos estavam todos mortos ou tinham-se tornado poetas ou artistas alimentados pela inspiração das drogas. Charmosos, só os que participavam em filmes com papéis de personagens de histórias antigas.
Homens inteligentes? Só os enfezados do clube de ciências, de quem só as miúdas (marronas) menos populares se aproximam.
O calor do amor substituído pela paixão e pelo fascínio de engatar alguém completamente desconhecido numa noite dos bares ou na discoteca, onde a música alta, a falta de iluminação, drogas e álcool alimentavam todos os pensamentos menos o de encontrar ali o "amor da nossa vida".

É a "Era do Fast-Food, Fast-Cars, Fast-Love". Tudo é rápido e tão superficial como...tudo. A vida tornou-se uma corrida à adrenalina, não há limites, nem físicos nem mentais. A racionalidade morreu, agora é altura dos sentidos tomarem conta do jogo. Há que aproveitar a vida, e o amor é coisa de velhos.

Oh...os príncipes e as princesas morreram... não há tempo para se amar ninguém - o amor morreu por falta de manutenção - morreu de fome como um cão esquecido.
E os anjos? Os anjos não nos salvam?

Os anjos já não encontram corações puros, porque os humanos aprenderam a fugir aos corações com estimulantes, calmantes, esteróides, sexo e carne. O mundo tornou-se tão grande e cheio de coisas, e o ser humano tentou engolir tanto e tão depressa, que o coração ficou soterrado. Agora, da mesma forma como a Mãe Terra ficou envenenada com poluentes, seus rios sujos e seu ar pestilento, o ser humano encheu-se de químicos, sujou todos os seus fluidos corporais, e respira o ar e bebe o ar que ele próprio empestou.
Os corações? Esses fugiram com os príncipes ou decidiram hibernar, esconderem-se num bloco de gelo para não serem quebrados, porque se ninguém o fizer, o seu próprio dono tratará do assunto. Fugiram e agora quem os quiser encontrar só talvez na madrugada de Sábado para Domingo, quando a loucura da noitada foi forte o suficiente para matar a insanidade de mente, e o coração consegue respirar num sonho....
Os príncipes passaram de moda...
As serenatas desapareceram...
Os artistas enamorados morreram de fome porque o amor não rendia...
E os anjos?
Os anjos morreram, envenenados em oceanos de poluição enquanto tentavam chegar aos corações afundados.

By Paulo Trindade Escrita Tribal